domingo, 2 de maio de 2010

Praia de Fão em risco


A emissão de 29 de Abril de 2010 do Biosfera, na RTPN, abordou em profundidade a situação da orla costeira portuguesa e entre várias situações foi abordada a da praia de Fão.

Maria Grego começou por enunciar algo que sintetiza o actual estado de coisas: 67% do litoral português está em risco.

A Costa do nosso parque Natural Litoral Norte, que corre toda a zona desde Viana do Castelo até ao sul de Fão/Esposende não é excepção.

A arriba da praia de Ofir, a sul do esporão, recuou 3 metros, só neste Inverno.
As Torres, que incluem 114 apartamentos e 15 espaços comerciais, hotel e algumas residências encontram-se assim em zona de risco, e cada vez mais susceptíveis.
O engº José Sócrates falou em demolições há 8 anos, em 21 Fev 2002, numa entrevista à TSF anunciou então a intenção de iniciar um processo de destruição destas torres, de 15 moradias implantadas no cordão dunar e da frente do Hotel Ofir, parcialmente construído sobre a praia. Contudo este processo parou devido à impopularidade e controvérsia gerada.

Todos os anos Portugal perde costa. Este ano não escapou à regra. A orla litoral está com muita falta de areia provocada pela forte ondulação, recuo natural e causas antrópicas como: construção de barragens, extracção de areias, construção costeira desenfreada e alterações climáticas.

Na zona norte, em temporal, a ondulação chega aos 8 metros na costa e o mar arrasta anualmente 2 milhões de m3 de sedimento.

Vejamos então exemplos concretos ao longo do país, que retratam a situação da orla costeira:
Nas zonas de Mafra e Sintra, 50 arribas estão em situação de derrocada eminente. Na Aguçadoira em dois anos a arriba recuou 6 metros.
No dia 21 de Agosto de 2009, em Albufeira na praia Maria Luisa, o aluimento de uma arriba tirou a vida a 5 pessoas.
Na praia da Fuzeta no Algarve foram destruídas este ano 44 casas das 71 casas existentes. Também as construções na praias de Faro, ilha de Cabanas e na ilha da Barreta estão em risco. Só no Algarve já foram intervencionadas 14 praias em desmantelamento, reforço e sinalização de arribas.
Em Quarteira, a praia mais afectada do Algarve, só entre Janeiro e Março de 2010, perderam-se 15 m de areal.
Entre Esmoriz e Vagueira estão 4000 casas em perigo.

Segundo Renato Henriques, investigador do Departamento de Ciências da Terra da Universidade do Minho a arriba da praia de Ofir, a sul do esporão, recuou 3 metros só neste Inverno.
Existe um fenómeno de recuo natural desde o término da pequena idade do gelo que começou final do sec. XIX. Contudo, devido à ocupação desenfreada da costa princialmente na década de 80, o recuo normal anual de 60 a 80cm foi amplificado de 4 a 5 vezes por causas antrópicas. Segundo este técnico a melhor solução seria contrariar o processo, desmontado as construções nas zonas interditas e reconstruir em zonas interiores seguras. Estas decisões políticas impopulares devem ser tomadas para equilibrar esta situação.

Na costa Algarvia a situação também não é fácil. Este foi o pior Inverno dos últimos 10 anos e 6 praias estão em alerta vermelho de segurança.

Na opinião de Delminda Moura e Óscar Ferreira, geólogos da Universidade do Algarve, as arribas (rochas do período Miocénico, com 25 milhões de anos) estão sapadas, i.e., não têm suporte por baixo, devido à acção das ondas e há o risco de desabamento. Também a água doce vinda das regas e piscinas, desfaz estas rochas carbonatadas fragilizando-as. Além disto a sobrecarga mecânica que a construção costeira exerce é mais um factor de instabilidade.
Os molhos que são construídos para proteger certas fracções da costa agravam a falta de sedimento nas zonas dadoras acelerarando a sua deterioração.
A distância de segurança relativa a uma arriba é 1,5 vezes a sua altura. Logo poucas praias existirão verdadeiramente seguras no Algarve.

Joaquim Barbosa, investigador CICGE, Fac. Ciências U.Porto esclarece que a fonte sedimentar mais importante para a costa são os rios. Contudo, devido à intensa construção de barragens travou-se esta alimentação sedimentar. O rio Douro tinha, em 1930, antes da construção das barragens a capacidade de transportar para o mar entre 1 a 2 milhões de m3 de areia.
Actualmente transporta sómente cerca de 0,25 milhões de m3. Também o problema da extracção de areias, para construção e navegabilidade dos rios, vem agravar esta situação.

Filipe Duarte dos Santos, Coordenador do PECAC, liderou um estudo promovido pela Agenda Cascais 21 e pela CM Cascais que revela que os areias das praias do concelho podem diminuir 80% até ao final do século.
No século passado o nível do mar subiu cerca de 15 cm (1,5 mm /ano). Contudo nos últimos 10 anos este valor subiu para 2,5 mm/ano. A direcção das ondas está também a rodar no sentido horário, i.e., estão a ficar mais paralelas à costa ocidental portuguesa o que intensifica a remoção de sedimentos de Norte para Sul.

Há falta de sedimentos na orla costeira e esta carência está a ser remediada com a construção de esporões e enchimento artificial de algumas praias para a salvaguardar temporariamente.

É necessário que nós e o poder político decidamos o que queremos fazer. Vamos manter a costa ou vamos recuar?

Para já a política tem sido tentar manter a linha de costa com engenharia pesada, em intervenções de valor avultado e nem sempre bem sucedidas, como no caso do Furadouro em que obras dispendiosas não evitaram a força destrutiva do mar.

Ao longo do tempo não foram respeitadas as faixas de risco definidas pelos técnicos nem o ordenamento do litoral e não podemos culpar só os políticos.

Dulce Pássaro, ministra do Ambiente, já anunciou o orçamento de 500 milhões de euros para a protecção do litoral português. Só para esporões e enrocamentos para protecção das zonas de risco em Ovar foram já gastos 6 milhões de euros.

Se for continuada a actual política de manutenção de costa, o deslizamento e derrocada de arribas, falésias cimentadas e enrocamentos de pedra, constituirão a paisagem da costa portuguesa no futuro e também da nossa praia.

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